Wanda Coleman – Uma conversa com meu neto de seis anos de idade

há uma tempestade cósmica sempre que ele está em minha órbita
cinco raças em guerra fora do tempo, aprisionadas

em um corpo alto e petulante, joelhos e cotovelos ossudos

os ensinamentos rigorosamente amorosos da mãe e do pai criam
raízes a despeito da engenharia de mídia e da pressão dos amigos.
as tiradas insolentes, comentários desbocados, e o humor atrevido
que em breve farão parte de suas defesas adolescentes ainda não
se materializaram. neste momento, ele sabe que não deve faltar à verdade e

assim, nesta manhã de outono, quando o chamo 
para uma conversa ancestral, ao coloca-lo no meu colo

ele hesita.

não tenha medo, eu digo. ele dá alguns pulinhos impacientes
que se transformam em contorções quando o agarro e o seguro com força

acomodado em minha suavidade, ele relaxa um pouco
mas fixa um olhar consternado em minhas mãos

isto é o que acontece, eu acho, quando os olhos vão contra o coração

          Você está todo confuso, não está?

          Sim.

          Sua mãe faz parte de mim. Qual é o meu nome?
          Do que você me chama?

          Vovó.

          Você não quer gostar de mim,
          não é mesmo?

          Sim.

          Porque eu sou morena1.

Ele fica em silêncio.

          É por que eu sou morena?

          Sim.

          Não faz mal. Eu vou
          ser morena para sempre. Tudo
          bem se eu gostar de você?

          Sim.

então eu o abraço e o solto, me perguntando
se isso será o suficiente para libertá-lo.

Trad.: Nelson Santander

  1. No poema, Wanda Coleman usa, para referir-se à sua própria cor de pele, a palavra brown, um termo frequentemente usado nos Estados Unidos para se referir às pessoas de origem afro-americana. A escolha deste termo – e não da palavra black – parece ter sido uma forma que ela encontrou de evitar a questão racial em relação ao neto, apenas uma criança, aparentemente não-preta. Tudo o que ela queria era deixa-lo menos desconfortável com a cor dela. Por isso, optei por traduzir brown como morena – e não como preta ou negra -, embora com uma certa insegurança. O tema é extremamente espinhoso, especialmente para os brancos que só podem tentar imaginar as situações dramáticas – como a descrita neste poema magnífico – enfrentadas por pessoas não-brancas.
A Talk with My Grandson, Age Six

there’s a cosmic storm whenever he’s in my orbit
five races at war outside time, trapped

in one spindly high-toned body, knobby elbows and knees

the rigorously loving teachings of mom and dad take
root despite media engineering and peer pressures.
the snippy cuttings, mouthy snipings, and cheeky wit
that will soon attend his adolescent defenses have yet
to materialize. right now he knows not to prevaricate

and so, that fall morning when i call him
to me for an ancestral chat, to take him into my lap

he hesitates.

don’t be afraid, i say. he takes a few eager skips
that turn into squirms when i grab him and hold him tight

situated in my softness, he relaxes some
but stares at my hands in consternation

this is what happens, i think, when the eyes go against the heart

You’re all mixed up, aren’t you?

Yes.

Your mother belongs to me. What’s my name?
What do you call me?

Grandma.

You don’t want to like me,
do you?

Yes.

Because I’m brown.

He’s silent.

Is it because I’m brown?

Yes.

Well, that’s okay. I’m going
to be brown forever. Is it
okay if I like you?

Yes.

then I hug him and let go, wondering
if that’s enough to set him free.