Tenho tanto sentimento Que é frequente persuadir-me De que sou sentimental, Mas reconheço, ao medir-me, Que tudo isso é pensamento, Que não senti afinal. Temos, todos que vivemos, Uma vida que é vivida E outra vida que é pensada, E a única vida que temos É essa que é dividida Entre a verdadeira e a … Continue lendo Fenando Pessoa – [Tenho tanto sentimento]
Categoria: Fernando Pessoa
Álvaro de Campos – Tabacaria
Não sou nada. Nunca serei nada. Não posso querer ser nada. À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo. Janelas do meu quarto, Do meu quarto de um dos milhões do mundo que ninguém sabe quem é (E se soubessem quem é, o que saberiam?), Dais para o mistério de uma rua … Continue lendo Álvaro de Campos – Tabacaria
Fernando Pessoa – No Túmulo de Christian Rosencreutz
NO TÚMULO DE CHRISTIAN ROSENCREUTZ Não tínhamos ainda visto o cadáver de nosso Pai prudente e sábio. Por isso afastámos para um lado o altar. Então pudemos levantar uma chapa forte de metal amarelo, e ali estava um belo corpo célebre, inteiro e incorrupto..., e tinha na mão um pequeno livro em pergaminho, escrito a … Continue lendo Fernando Pessoa – No Túmulo de Christian Rosencreutz
Alberto Caeiro – Quando vier a primavera
Quando vier a primavera, Se eu já estiver morto, As flores florirão da mesma maneira E as árvores não serão menos verdes que na primavera passada. A realidade não precisa de mim. Sinto uma alegria enorme Ao pensar que a minha morte não tem importância nenhuma. Se soubesse que amanhã morria E a primavera era … Continue lendo Alberto Caeiro – Quando vier a primavera
Álvaro de Campos – Poema em Linha Reta
Nunca conheci quem tivesse levado porrada. Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo. E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil, Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita, Indesculpavelmente sujo, Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho, Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo, Que tenho enrolado … Continue lendo Álvaro de Campos – Poema em Linha Reta
Fernando Pessoa – Autopsicografia
O poeta é um fingidor. Finge tão completamente Que chega a fingir que é dor A dor que deveras sente. E os que leem o que escreve, Na dor lida sentem bem, Não as duas que ele teve, Mas só a que eles não têm. E assim nas calhas de roda Gira, a entreter a … Continue lendo Fernando Pessoa – Autopsicografia
Álvaro de Campos – Lisbon Revisited (1926)
Nada me prende a nada. Quero cinquenta coisas ao mesmo tempo. Anseio com uma angústia de fome de carne O que não sei que seja - Definidamente pelo indefinido... Durmo irrequieto, e vivo num sonhar irrequieto De quem dorme irrequieto, metade a sonhar. Fecharam-me todas as portas abstractas e necessárias. Correram cortinas de todas as … Continue lendo Álvaro de Campos – Lisbon Revisited (1926)
Alberto Caeiro – Há Metafísica demais em não Pensar em Nada
Não acredito em Deus porque nunca o vi. Se ele quisesse que eu acreditasse nele, Sem dúvida que viria falar comigo E entraria pela minha porta dentro Dizendo-me, Aqui estou! (Isto é talvez ridículo aos ouvidos De quem, por não saber o que é olhar para as coisas, Não compreende quem fala delas Com o … Continue lendo Alberto Caeiro – Há Metafísica demais em não Pensar em Nada
Ricardo Reis – Odes: 153 – Como este infante que alourado dorme
Como este infante que alourado dorme Fui. Hoje sei que há morte, Lídia, há largas taças por encher Nosso amor que nos tarda. Qualquer que seja o amor ou a taça, cedo Cessa. Receia, e apressa.
Ricardo Reis – Odes: 144 – Uns, com os olhos postos no passado,
Uns, com os olhos postos no passado, Vêem o que não vêem; outros, fitos Os mesmos olhos no futuro, vêem O que não pode ver-se. Porque tão longe ir pôr o que está perto — A segurança nossa? Este é o dia, Esta é a hora, este o momento, isto É quem somos, e é … Continue lendo Ricardo Reis – Odes: 144 – Uns, com os olhos postos no passado,