Kim Moore – Para minha filha

E mais tarde, quando ela perguntar,
direi que algumas partes foram belas –
como, em seu brilho
e súbita abertura,
os rostos dos vizinhos
passaram a parecer flores.
Contarei como começamos
a revisitar fotos
de nossos eus mais jovens,
abraçados a um estranho
ou apoiados nos ombros
de amigos, e vimos que o toque
sempre foi uma espécie de santidade,
uma forma de adoração que nos foi prometida.
Direi a ela que, de certa forma,
nossos dias se reduziram a nada,
sendo ao mesmo tempo tão longos quanto um ano
e tão velozes quanto o virar de uma página.
Vou contar como ela aprendeu a engatinhar
naqueles dias, naqueles tempos
em que não podíamos sair,
em que os corpos eram retirados
das casas e não eram contabilizados,
que ela falou sua primeira palavra
enquanto a morte rondava as ruas,
que, embora eu estivesse com medo,
nunca vi o medo em seus olhos.

Trad.: Nelson Sanander

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For my daughter

And later, when she asks,
I’ll say some parts of it were beautiful –
how in their brightness
and sudden opening
the faces of the neighbours
began to look like flowers.
I’ll tell her how we began
to look back at photos
of our younger selves
with our arms around a stranger
or leaning on the shoulders
of friends, and saw that touch
had always been a kind of holiness,
a type of worship we were promised.
I’ll tell her that in some ways
our days shrunk to nothing,
being both as long as a year
and as quick as the turning of a page.
I’ll tell her how she learned to crawl
in those days, in those times
when we could not leave,
when bodies were carried
from homes and were not counted,
that she began to say her first word
while death waited in the streets,
that though I was afraid,
I never saw fear in her eyes.