A minha bisavó
é um quadro na parede.
Roída pela traça, ela
sucumbe à dentição do tempo
nos seus olhos escuros de
discreta bruxa.
Um dia a minha bisavó
nem quadro há-de ser.
Continuará, apesar disso, a beber
a água do copo onde lavou
as cerejas (fingindo-se distraída)
e a arrazoar antes da visita
extemporânea aos vizinhos:
“se gostarem da visita, ficamos
todos contentes, se não gostarem
é muito bem feita”.
A minha bisavó hoje não responde
Mas há um par de meias novas na
minha memória, um prato de
cerejas.