Matthew Olzmann – Carta à pessoa que gravou suas iniciais no mais antigo pinheiro de folha longa da América do Norte

Southern Pines, Carolina do Norte

Diga-me como é viver sem
curiosidade, sem sentir admiração. Navegar
em águas cristalinas, desviando os olhos
dos recifes de algas que ondulam
abaixo de você, ignorando o cintilar
das escamas de sereias no nevoeiro,
olhando para o mundo e sentindo
apenas tédio. Estar
à beira do precipício de algum vale selvagem,
as águias circulando, um rebanho de caribus
trovejando lá embaixo, e bocejar
com indiferença. Descobrir
algo primordial e sagrado.
Sentir o cheiro da terra
acolhendo-o por toda parte.
Absorver tudo isso e, então,
empunhar sua faca.

Trad.: Nelson Santander

Letter to the Person Who Carved His Initials into the Oldest Living Longleaf Pine in North America

Southern Pines, NC

Tell me what it’s like to live without
curiosity, without awe. To sail
on clear water, rolling your eyes
at the kelp reefs swaying
beneath you, ignoring the flicker
of mermaid scales in the mist,
looking at the world and feeling
only boredom. To stand
on the precipice of some wild valley,
the eagles circling, a herd of caribou
booming below, and to yawn
with indifference. To discover
something primordial and holy.
To have the smell of the earth
welcome you to everywhere.
To take it all in, and then,
to reach for your knife.

Matthew Olzmann – Comercial de Mountain Dew disfarçado de poema de amor

Então, eis o que eu tenho, as razões pelas quais nosso casamento
pode funcionar: porque você usa rosa, mas escreve poemas
sobre lápides e balas. Porque você grita
com suas chaves quando as perde, e ri,
ruidosamente, de suas próprias piadas. Porque você sabe empunhar uma pistola,
estripar um porco. Porque você memoriza canções, mesmo jingles
de trinta anos atrás, e as entoa quando inspira.
Você tem mãos macias. Porque quando nos mudamos, o conteúdo
do que você embalou ficou escrito dentro das caixas.
Porque você acha os cisnes superestimados e meio estúpidos.
Porque você me levou até a estação ferroviária. Você me levou
para Minneapolis. Você me levou para Providence.
Porque você sublinha tudo o que lê, e circula
as coisas que acha importantes, e coloca estrelas ao lado
das coisas que acha que eu deveria considerar importantes,
e escreve notas marginais sobre todas as pessoas
com quem você está irritada e meu nome quase nunca está lá.
Porque você fez aquela receita de carne de porco que achou
no livro de culinária da Frida Kahlo. Porque quando leu
aquele ensaio sobre Rilke, você sublinhou tudo,
exceto a parte onde Rilke diz que amar significa negar-se a si mesmo
e ser consumido pelas chamas. Porque quando as luzes
estão apagadas, as cortinas, fechadas, e um lençol adicional pregado
nas janelas, você ainda acredita que alguém do lado de fora
pode vê-la. E um dia, cinco verões atrás,
quando você não podia colocar gasolina em seu carro, quando sua geladeira
estava tão vazia — sem sequer restos e condimentos —,
havia ali uma única garrafa de 500 ml de Mountain Dew,
que você pagou com seu último maldito centavo
porque uma vez me ouviu dizer que eu gostava.

Trad.: Nelson Santander

Mountain Dew Commercial Disguised as a Love Poem

So here’s what I’ve got, the reasons why our marriage
might work: Because you wear pink but write poems
about bullets and gravestones. Because you yell
at your keys when you lose them, and laugh,
loudly, at your own jokes. Because you can hold a pistol,
gut a pig. Because you memorize songs, even commercials
from thirty years back and sing them when vacuuming.
You have soft hands. Because when we moved, the contents
of what you packed were written inside the boxes.
Because you think swans are overrated and kind of stupid.
Because you drove me to the train station. You drove me
to Minneapolis. You drove me to Providence.
Because you underline everything you read, and circle
the things you think are important, and put stars next
to the things you think I should think are important,
and write notes in the margins about all the people
you’re mad at and my name almost never appears there.
Because you made that pork recipe you found
in the Frida Kahlo Cookbook. Because when you read
that essay about Rilke, you underlined the whole thing
except the part where Rilke says love means to deny the self
and to be consumed in flames. Because when the lights
are off, the curtains drawn, and an additional sheet is nailed
over the windows, you still believe someone outside
can see you. And one day five summers ago,
when you couldn’t put gas in your car, when your fridge
was so empty—not even leftovers or condiments—
there was a single twenty-ounce bottle of Mountain Dew,
which you paid for with your last damn dime
because you once overheard me say that I liked it.