Cada qual em sua cama, deitados separados agora,
Ele com um livro, uma luz acesa até hora incerta,
Ela, como uma menina, sonhando com sua aurora,
Todos os homens em outros lugares – é como se certa
Nova ocorrência esperassem: o livro que ele detém
Mas não lê, os olhos dela pregados nas sombras além.
Lançados acima como destroços de antiga paixão,
Como são bons em mentir. Quase nunca se tocam, os dois,
Ou se o fazem, é como se fosse uma confissão
De terem poucos sentimentos – ou sentimentos demais.
A castidade os confronta, um destino para o qual
A vida inteira deles dois foi uma preparação.
Estranhamente separados, mas inexplicavelmente
Ligados, o silêncio entre eles é como um fio que
Prende mas não enreda. E o tempo, uma pena levemente
Tocando-os. Será que eles têm a consciência de
Que estão velhos, ambos, meu pai e minha progenitora,
E que o fogo do qual eu procedi arrefeceu agora?
Trad.: Nelson Santander
One Flesh
Lying apart now, each in a separate bed,
He with a book, keeping the light on late,
She like a girl dreaming of childhood,
All men elsewhere – it is as if they wait
Some new event: the book he holds unread,
Her eyes fixed on the shadows overhead.
Tossed up like flotsam from a former passion,
How cool they lie. They hardly ever touch,
Or if they do, it is like a confession
Of having little feeling – or too much.
Chastity faces them, a destination
For which their whole lives were a preparation.
Strangely apart, yet strangely close together,
Silence between them like a thread to hold
And not wind in. And time itself’s a feather
Touching them gently. Do they know they’re old,
These two who are my father and my mother
Whose fire from which I came, has now grown cold?