Garrett Hongo – Mendocino Rose

Na Califórnia, ao norte da Golden Gate,
a vinha cresce por quase todos os cantos,
      brotando de pastagens,
de baixo das sombras dos eucaliptos
      à beira da estrada,
ultrapassando todos os casebres fantasmas e cercas quebradas
      que se desintegram de podres,
encharcadas pelas chuvas frescas.

Ela mimetiza, em suas réplicas firmes, parecidas com nuvens,
      a forma de tudo o que asfixia,
uma delicada vegetação
      treliçada ao lado
de um celeiro ou estação de bombeamento,
      muito distante dos penhascos acima da Highway 1,
florzinhas e flores,
      da estrada mesmo,
parecidas com nós e dreadlocks,
      efêmeras e gloriosas,
suspensas em beirais cobertos de vegetação.

Eu ouvia uma fita no som do carro,
uma canção que eu tocava e rebobinava,
      e tocava de novo,
uma balada ou uma canção de amor
      cantada pelo meu tenor favorito,
um havaiano conhecido por sua pobreza
      mas riqueza de coração,
e senti, rodando pelas tortuosas curvas
      daquela estrada costeira,
deslizando no asfalto escorregadio
      através dos desníveis e das curvas em S,
e freando na hora certa,
      que ela teria servido como o hino fúnebre
que eu não sabia cantar
      quando precisava,
uma canção para cadenciar meu coração
      e seu balbuciar desafinado.

Ipo lei manu, ele cantou, sem se confundir,
E envio estas grinaldas,
e as rosas pareciam, por toda parte ao meu redor então,
      profusas e luxuriosas
como a chuva em suas vestes cinzentas,
      procissões ondulantes sobre a terra,
ecos, em emaranhados de cores extravagantes,
      de música
e de formas em colapso
      sobre as quais elas pareciam triunfar.

Trad.: Nelson Santander

Em sua biografia, Volcano: A Memoir of Hawai’i, o autor assim discorre sobre esse poema:

Quando percebi o que aquele homem estava cantando, um verdadeiro sentimento de luto cresceu dentro de mim como uma rebentação e eu mergulhei nele. Eu olhei para além da estrada de asfalto preto que serpenteava à minha frente em direção às rosas florescendo ao meu redor como se também fossem uma música. Olhei para os penhascos do outro lado do Pacífico… Não era apenas um lugar, mas uma determinação de propósito, suponho, um sentimento de conexão não tanto com um lugar em particular, embora isso ajude, mas com o mundo dos sentimentos e da abertura a eles, essa troca entre o humano e o que quer que seja o resto – o infinito, digamos, ou o mundo natural do espírito puro que os filósofos românticos do século XIX definiram como sublime. O que quer que seja maior do que o eu, mas que, no entanto, fortalece o eu, oprime e anima o eu. “E quem, se eu chorasse, me ouviria entre as ordens angelicais?” escreveu Rilke, com ceticismo, em suas Elegias de Duino. “E mesmo que um deles me tomasse inesperadamente em seu oração, aniquilar-me-ia sua existência demasiado forte” Pois que é o Belo senão o grau do Terrível que ainda suportamos e que admiramos porque, concluiu, impassível, desdenha destruir-nos. É o vajra do budista, o relâmpago da percepção pura e cósmica, um luto que leva à eternidade.

Mendocino Rose

In California, north of the Golden Gate,
the vine grows almost everywhere,
      erupting out of pastureland,
from under the shade of eucalyptus
      by the side of the road,
overtaking all the ghost shacks and broken fences
      crumbling with rot
and drenched in the fresh rains.

It mimes, in its steady, cloudlike replicas,
      the shape of whatever it smothers,
a gentle greenery
      trellised up the side
of a barn or pump station
      far up the bluffs above Highway 1,
florets and blossoms,
      from the road anyway,
looking like knots and red dreadlocks,
      ephemeral and glorious,
hanging from overgrown eaves.

I’d been listening to a tape on the car stereo,
a song I’d play and rewind,
      and play again,
a ballad or a love song
      sung by my favorite tenor,
a Hawaiian man known for his poverty
      and richness of heart,
and I felt, wheeling through the vinelike curves
      of that coastal road,
sliding on the slick asphalt
      through the dips and in the S-turns,
and braking just in time,
      that it would have served as the dirge
I didn’t know to sing
      when I needed to,
a song to cadence my heart
      and its tuneless stammering.

Ipo lei manu, he sang, without confusion,
I send these garlands,
and the roses seemed everywhere around me then,
      profuse and luxurious
as the rain in its grey robes,
      undulant processionals over the land,
echoes, in snarls of extravagant color,
      of the music
and the collapsing shapes
      they seemed to triumph over.