Elisa Lucinda – Do Efêmero Presente

Às vezes passo um dia
e sinto que o perdi.
Um dia sem importâncias dentro dele,
sem fruto, sem feito,
metade avião, metade hotel.
Mas que mania é essa de querer
que o pobre do dia seja sempre cheio de tarefas?
Um dia escravinho, sofrendo na senzala calendário.
Ora essa, tem gente que dorme quase todos os dias o dia todo,
tem gente que passa o dia
sequestrado pela tela da televisão,
cama, sofá e dor nas costas.
Tem gente que nem nota,
tem quem vive só no computador,
toma remédio para nem sentir passar o dia,
e toma outro para que a noite seja uma hipnose,
já que é a sua vida uma overdose de desanimação.

Eu não.
Ao menos num dia assim,
dele não me despeço sem fazer, no mínimo,
esses mínimos versos.