Tem bombas de gasolina com o Pégaso vermelho1,
mas não é apenas um posto de gasolina, seu pai não é meu pai,
de pé sobre mim, com uma prancheta, conferindo as coisas feitas e por fazer.
Ele parece feliz nesta última parada antes da morte para os que vivem,
antes da vida para os que ainda não nasceram,
onde seu armazém geral negocia farinha, açúcar, cortes de carnes,
ou fígado, roxo-avermelhado, um coração que ele embrulha em papel pardo.
Ele corta meu cabelo sob a cobertura de zinco. Devo ter chegado aqui
de uma direção ou outra pela estrada que se estende de horizonte a horizonte,
o calor do deserto fazendo meus olhos tremular como poças.
Cheguei engatinhando,
e ele me entregou uma Nehi de laranja gelada.
É pura coincidência que esta loja seja do meu pai.
Pergunto-lhe de onde vem toda essa mercadoria, já que nenhum caminhão passa por essa estrada
para repor produtos que ninguém compra.
Ele não gosta de perguntas que desafiam sua existência.
Fico quieto, pois ele está cortando meu cabelo
e pode, consciente ou inconscientemente, me deixar com uma aparência ridícula.
Você está fazendo um ótimo trabalho aqui, digo, o que ele sabe que é besteira –
quantos pais, mesmo mortos, montam um armazém geral no deserto?
Insisto: Você mantém as prateleiras abastecidas, o chão varrido, o banheiro limpo.
Quanto mais falo, mais me encorajo a amá-lo pelo trabalho que teve
para fazer tudo isso parecer real, com latas de pregos de todos os tamanhos, feijão, arroz,
prateleiras de bebidas, balcão de frios com picles gigantes.
Começo a perceber que homem querido e doce ele é. Será porque está morto?
Queria que estivesse vivo outra vez.
Não acho que ele tenha se matado só para me magoar pessoalmente.
À noite, ele diz, coiotes uivantes descem das montanhas
e deixam recados, versículos bíblicos, ameaças, cartas de amor.
Tudo que um coiote precisa tirar do peito.
Pergunto se eles vêm todas as noites.
Sem falta, ele diz
Trad.: Nelson Santander
Mais do que uma leitura, uma experiência. Clique, compre e contribua para manter a poesia viva em nosso blog
My Dead Father’s General Store in the Middle of a Desert
It has gas pumps with red horses and wings,
but is not merely a gas station, your father is not my father,
standing over me with a clipboard, checking off things done and left undone.
He seems happy at this last stop before death for those living,
before life for those not yet born,
where his general store deals in flour, sugar, pieces of hacked meat,
or liver, reddish purple, a heart he wraps in brown paper.
He cuts my hair beneath the tin awning. I must have gotten here
from one direction or other on the road that stretches horizon to horizon,
the desert heat shimmering my eyes into pools.
I crawled in on my hands and knees,
he handed me an ice-cold orange Nehi drink.
It’s pure coincidence that this store is my father’s.
I ask him where all this stuff comes from, as no trucks travel this road
to replenish merchandise no one buys.
He doesn’t like questions that challenge his existence.
I become quiet, he’s cutting my hair
and might consciously or unconsciously make me look bad.
You’re doing a great job out here, I say, which he knows is bullshit –
how many fathers, even if they’re dead, set up a general store in a desert.
I persist, You keep the shelves stocked, floor broomed, bathroom clean.
The more I talk, the more I encourage myself to love him for the trouble he went to
making all this seem real, with cans of various sized nails, beans, rice,
shelves of liquor, deli section with giant pickles.
I begin to see what a dear, sweet man he is. Is this because he is dead?
I wish he were alive again.
I don’t think he killed himself to be mean to me personally.
At night, he says, howling coyotes come down from the mountains
and leave notes, Bible verses, threatening messages, love letters.
Everything a coyote wants to get off its chest.
I ask if they come every night.
He says, Without fail.