Deus tira seu retrato: não desvie o olhar –
agora, neste quarto, seu rosto inclinado
exatamente como é, antes de você pensar
ou controla-lo. Vá em frente, deixe-se trair por
todas as urgências secretas e ainda mantenha
aquele disfarce parcial que você chama de caráter.
Mesmo o seu lábio, dizem, o modo como ele arqueia
ou não, ou hesita, entregará
volumes de provas. A câmera, totalmente aberta,
está pronta; a exposição é de uns trinta e cinco anos
ou mais – depois disso você se torna
aquilo que verniz já era, por completo.
Agora você quer se explicar. Sua mãe
foi uma certa – como expressa-lo? – influência.
Sim. E seu pai, seja lá o que tenha sido,
não poderia mudar isso. Não. E sua cidade,
claro, tinha seus limites. Continue, siga falando:
Espere. Não se mexa. Esse é você para sempre.
Trad.: Nelson Santander
REPUBLICAÇÃO: poema originalmente publicado na página em 21/03/2020
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An archival print
God snaps your picture: don’t look away –
this room right now, your face tilted
exactly as it is before you can think
or control it. Go ahead, let it betray
all the secret emergencies and still hold
that partial disguise you call your character.
Even your lip, they say, the way it curves
or doesn’t, or can’t decide, will deliver
bales of evidence. The camera, wide open,
stands ready; the exposure is thirty-five years
or so – after that you have become
whatever the veneer is, all the way through.
Now you want to explain. Your mother
was a certain – how to express it? – influence.
Yes. And your father, whatever he was,
you couldn’t change that. No. And your town
of course had its limits. Go on, keep talking :
Hold it. Don’t move. That’s you forever.