William Butler Yeats – “When you are old” em 4 traduções

Quando fores velha, grisalha, vencida pelo sono – Trad.: José Agostinho Baptista

Quando fores velha, grisalha, vencida pelo sono,
Dormitando junto à lareira, toma este livro,
Lê-o devagar, e sonha com o doce olhar
Que outrora tiveram teus olhos, e com as suas sombras profundas;

Muitos amaram os momentos de teu alegre encanto,
Muitos amaram essa beleza com falso ou sincero amor,
Mas apenas um homem amou tua alma peregrina,
E amou as mágoas do teu rosto que mudava;

Inclinada sobre o ferro incandescente,
Murmura, com alguma tristeza, como o Amor te abandonou
E em largos passos galgou as montanhas
Escondendo o rosto numa imensidão de estrelas.

Quando fores velha e triste e cansada – Trad.: Adriano Nunes

Quando fores velha e triste e cansada,
E em ordem co’ o fogo, pega este livro
E lê lentamente, e lembra o olhar vivo
Que tinhas, e da sombra aprofundada.

Amaram-te dias de graça grácil,
E teu fulgor co’ amor falso ou sincero,
Mas amou-te um ser n’alma o destempero,
E as mágoas da tua face volátil.

E curvando-te à grade incandescente,
Murmura, amarga, como o amor fugiu
E seguiu monte acima, a subir sempre
E a face em grupos d’astros encobriu.

Quando velha e grisalha e exausta – Trad.: Paulo Vizioli

Quando velha e grisalha e exausta, ao fim do dia,
tu cabeceares junto ao fogo, vem folhear
lentamente este livro, e lembra o doce olhar
e as sombras densas que nos olhos teus havia.

Quantos, com falsidade ou devoção sincera,
amaram-te a beleza e graça de menina!
Um só, porém, amou tua alma peregrina,
e amou as dores desse rosto que se altera.

E junto às brasas, inclinando-se sobre elas,
murmura, um pouco triste, como o amor distante
passou por cima das montanhas adiante,
e escondeu sua face entre um milhão de estrelas.

Quando estiveres grisalha e com sono – Trad.: Jorge Wanderley

Quando estiveres grisalha e com sono,
Dormitando ante o fogo, lê meu livro
Bem lentamente e lembra o sensitivo
Olhar que tinhas de suave abandono.

Muitos amaram tuas alegrias,
Tua beleza; mas só num culmina
O amor por tua alma peregrina
E a mágoa que teu rosto pressentia.

Reclina-te ante as chamas; e ao vê-las
Lamentes, triste Amor – que te deixou
Pelos montes mais altos que encontrou
E o rosto disfarçou entre as estrelas.

REPUBLICAÇÃO: poema originalmente publicado na página em 20/09/2020

When you are old

When you are old and grey and full of sleep,
And nodding by the fire, take down this book,
And slowly read, and dream of the soft look
Your eyes had once, and of their shadows deep;

How many loved your moments of glad grace,
And loved your beauty with love false or true,
But one man loved the pilgrim soul in you,
And loved the sorrows of your changing face;

And bending down beside the glowing bars,
Murmur, a little sadly, how Love fled
And paced upon the mountains overhead
And hid his face amid a crowd of stars.

W. H. Auden – À memória de W. B. Yeats

1
Ele se foi na hora morta do inverno.
Os arroios estavam gelados, os aeroportos quase desertos,
E a neve deformava estátuas públicas
O mercúrio desceu na boca do dia a morrer.
Oh os instrumentos todos concordam
O dia de sua morte foi um dia frio e escuro.

Longe de sua doença,
Os lobos percorriam as florestas sempre verdes,
Ia-se o rio agreste livre dos cais em moda;
E foi por vozes plangentes
De seus poemas afastada a morte do poeta.

Foi para ele, no entanto, a última tarde como ele próprio,
Uma tarde de enfermeiras e rumores;
As províncias de seu corpo rebelaram-se,
Esvaziaram-se as praças de sua mente,
O silêncio invadiu os seus subúrbios,
E cessou a corrente dos sentidos. Ele se transformou em seus admiradores.

Agora vai disperso por centenas de cidades,
E inteiramente entregue a afeições desconhecidas;
Para encontrar ventura em bosques diferentes,
E ser punido sob estranhos preceitos de consciência:
As palavras de um morto
Se modificam nas entranhas dos que vivem.

Mas na importância e no barulho de amanhã,
Quando os corretores rugirem como feras nos assoalhos da Bolsa,
E os pobres padecerem como estão acostumados,
E cada qual na cela de si próprio quase julgar-se livre,
Alguns milhares hão de pensar nesse dia,
Como num dia em que se fez algo um pouco diferente.

Oh todos os instrumentos concordam
O dia de sua morte foi um dia frio e escuro.

2

Você era tolo como nós: seu dom resistiu a tudo;
À paróquia de ricas mulheres, à decadência fisica,
À você mesmo, que a louca Irlanda machucou até à poesia.
Ela ainda vive com seu clima e em seu estado de demência,
Pois a poesia não faz nada suceder: apenas sobrevive
No vale de seus ditos onde executivos
Jamais se arriscariam; para o sul desce a correr
De ranchos solitários e sofrimentos vivos,
Cruas cidades em que cremos e morremos; sobrevive,
O
Uma boca, um modo de acontecer.

3
Terra, acolhe hóspede honroso;
William Yeats jaz em repouso:
Da Irlanda a jarra vazia
Descanse sem a poesia.

O tempo que é intolerante
Com os bravos e inocentes,
E despreza em poucos dias
As belas anatomias,

Adora a língua e perdoa
A quem a vida lhe doa,
Perdoa o medo, a altivez,
Deita-lhe as honras aos pés;

Perdoou com escusas tais
Kipling e seus ideais,
Perdoará Claudel também,
E este, que escreveu bem.

Ladram no sonho de breu
Os cães do mundo europeu,
E as nações vivas esperam,
Nos ódios que as dilaceram.

A intelectual desgraça
Em todo rosto ameaça,
E tranca-se e gela o mar
Da piedade em todo olhar.

Siga o poeta e se afoite
Nas profundezas da noite,
Com a voz irrefreada
A cantar nos persuada.

Com o cultivo das linhas
Da maldição crie vinhas,
Celebre o insucesso humano
No enlevo do desengano.

Na areia do coração
Solte a água de redenção
No dia aprisionador
Ao livre ensine o louvor.

Trad.: Paulo Vizioli

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In memory of W. B. Yeats

He disappeared in the dead of winter:
The brooks were frozen, the airports almost deserted,
And snow disfigured the public statues;
The mercury sank in the mouth of the dying day.
O all the instruments agree
The day of his death was a dark cold day.

Far from his illness
The wolves ran on through the evergreen forests,
The peasant river was untempted by the fashionable quays;
By mourning tongues
The death of the poet was kept from his poems.

But for him it was his last afternoon as himself,
An afternoon of nurses and rumours;
The provinces of his body revolted,
The squares of his mind were empty,
Silence invaded the suburbs,
The current of his feeling failed; he became his admirers.

Now he is scattered among a hundred cities
And wholly given over to unfamiliar affections,
To find his happiness in another kind of wood
And be punished under a foreign code of conscience.
The words of a dead man
Are modified in the guts of the living.

But in the importance and noise of to-morrow
When the brokers are roaring like beasts on the floor of the Bourse,
And the poor have the sufferings to which they are fairly accustomed,
And each in the cell of himself is almost convinced of his freedom,
A few thousand will think of this day
As one thinks of a day when one did something slightly unusual.

O all the instruments agree
The day of his death was a dark cold day.

II

You were silly like us; your gift survived it all:
The parish of rich women, physical decay,
Yourself; mad Ireland hurt you into poetry.
Now Ireland has her madness and her weather still,
For poetry makes nothing happen: it survives
In the valley of its saying where executives
Would never want to tamper, it flows south
From ranches of isolation and the busy griefs,
Raw towns that we believe and die in; it survives,
A way of happening, a mouth.

III

Earth, receive an honoured guest:
William Yeats is laid to rest.
Let the Irish vessel lie
Emptied of its poetry.

Time that is intolerant
Of the brave and innocent,
And indifferent in a week
To a beautiful physique,

Worships language and forgives
Everyone by whom it lives;
Pardons cowardice, conceit,
Lays its honours at their feet.

Time that with this strange excuse
Pardoned Kipling and his views,
And will pardon Paul Claudel,
Pardons him for writing well.

In the nightmare of the dark
All the dogs of Europe bark,
And the living nations wait,
Each sequestered in its hate;

Intellectual disgrace
Stares from every human face,
And the seas of pity lie
Locked and frozen in each eye.

Follow, poet, follow right
To the bottom of the night,
With your unconstraining voice
Still persuade us to rejoice;

With the farming of a verse
Make a vineyard of the curse,
Sing of human unsuccess
In a rapture of distress;

In the deserts of the heart
Let the healing fountain start,
In the prison of his days
Teach the free man how to praise.

William Butler Yeats – “When you are old” em 4 traduções

Quando fores velha, grisalha, vencida pelo sono – Trad.: José Agostinho Baptista

Quando fores velha, grisalha, vencida pelo sono,
Dormitando junto à lareira, toma este livro,
Lê-o devagar, e sonha com o doce olhar
Que outrora tiveram teus olhos, e com as suas sombras profundas;

Muitos amaram os momentos de teu alegre encanto,
Muitos amaram essa beleza com falso ou sincero amor,
Mas apenas um homem amou tua alma peregrina,
E amou as mágoas do teu rosto que mudava;

Inclinada sobre o ferro incandescente,
Murmura, com alguma tristeza, como o Amor te abandonou
E em largos passos galgou as montanhas
Escondendo o rosto numa imensidão de estrelas.

Quando fores velha e triste e cansada – Trad.: Adriano Nunes

Quando fores velha e triste e cansada,
E em ordem co’ o fogo, pega este livro
E lê lentamente, e lembra o olhar vivo
Que tinhas, e da sombra aprofundada.

Amaram-te dias de graça grácil,
E teu fulgor co’ amor falso ou sincero,
Mas amou-te um ser n’alma o destempero,
E as mágoas da tua face volátil.

E curvando-te à grade incandescente,
Murmura, amarga, como o amor fugiu
E seguiu monte acima, a subir sempre
E a face em grupos d’astros encobriu.

Quando velha e grisalha e exausta – Trad.: Paulo Vizioli

Quando velha e grisalha e exausta, ao fim do dia,
tu cabeceares junto ao fogo, vem folhear
lentamente este livro, e lembra o doce olhar
e as sombras densas que nos olhos teus havia.

Quantos, com falsidade ou devoção sincera,
amaram-te a beleza e graça de menina!
Um só, porém, amou tua alma peregrina,
e amou as dores desse rosto que se altera.

E junto às brasas, inclinando-se sobre elas,
murmura, um pouco triste, como o amor distante
passou por cima das montanhas adiante,
e escondeu sua face entre um milhão de estrelas.

Quando estiveres grisalha e com sono – Trad.: Jorge Wanderley

Quando estiveres grisalha e com sono,
Dormitando ante o fogo, lê meu livro
Bem lentamente e lembra o sensitivo
Olhar que tinhas de suave abandono.

Muitos amaram tuas alegrias,
Tua beleza; mas só num culmina
O amor por tua alma peregrina
E a mágoa que teu rosto pressentia.

Reclina-te ante as chamas; e ao vê-las
Lamentes, triste Amor – que te deixou
Pelos montes mais altos que encontrou
E o rosto disfarçou entre as estrelas.

When you are old

When you are old and grey and full of sleep,
And nodding by the fire, take down this book,
And slowly read, and dream of the soft look
Your eyes had once, and of their shadows deep;

How many loved your moments of glad grace,
And loved your beauty with love false or true,
But one man loved the pilgrim soul in you,
And loved the sorrows of your changing face;

And bending down beside the glowing bars,
Murmur, a little sadly, how Love fled
And paced upon the mountains overhead
And hid his face amid a crowd of stars.

William Blake – Londres

Em cada rua escriturada em que ando,
Onde o Tâmisa escriturado passa,
Eu nos rostos que encontro vou notando
Os sinais da doença e da desgraça.

Ouço nos gritos que os adultos dão,
E nos gritos de medo do inocente,
Em cada voz, em cada interdição,
As algemas forjadas pela mente

Se o Limpa-Chaminés acaso grita,
Assusta a Igreja escura pelos anos;
Se o Soldado suspira de desdita,
O sangue mancha os muros palacianos.

Mas o que mais à meia noite é ouvido
É a rameira a lançar praga fatal,
Que estanca o pranto do recém nascido
E empesteia a mortalha conjugal

Trad.: Paulo Vizioli

William Butler Yeats – Quando Velha e Grisalha…

Quando velha e grisalha e exausta, ao fim do dia,
tu cabeceares junto ao fogo, vem folhear
lentamente este livro, e lembra o doce olhar
e as sombras densas que nos olhos teus havia.

Quantos, com falsidade ou devoção sincera,
amaram-te a beleza e graça de menina!
Um só, porém, amou tua alma peregrina,
e amou as dores desse rosto que se altera.

E junto às brasas, inclinando-se sobre elas,
murmura, um pouco triste, como o amor distante
passou por cima das montanhas adiante,
e escondeu sua face entre um milhão de estrelas.

Trad.: de Paulo Vizioli