Jules Laforgue – O silêncio azul

Por todo o transcorrido eterno e no vindouro,
A Noite universal povoa-se infinita
E cegamente em coágulos onde se agita
A vida que rabisca em arabescos de ouro.

Eis que um daqueles, tão desassistido e só,
Junto a seus deuses, artes, erros e mania,
Seu lodaçal, miséria e cantos de ironia,
Escreve história, grita ao céu e vira pó.

No tempo, é um minuto; um átomo, no espaço,
E um dia o globo morto, tumba do que fora,
Some no nada, sem deixar o nome – ou traço.

Tudo se vai! E o que lhe fez viver outrora?
Onde encontrar sentido no dolente entrudo?
O céu, eterno e azul: melhor quedar-se mudo.

Trad.: André Valias

REPUBLICAÇÃO: poema publicado na página originalmente em 04/11/2019

Mais do que uma leitura, uma experiência. Clique, compre e contribua para manter a poesia viva em nosso blog

Le silence bleu

Depuis l’éternité passée et pour toujours,
La Nuit universelle en tous sens infinie
Se peuple aveuglément de blocs grouillants de vie,
En paraboles d’or entrelaçant leurs cours.

L’un d’eux, dans ces splendeurs perdu, seul, sans secours, Avec ses dieux, ses arts, ses erreurs, son génie, Ses fanges, sa misère et ses chants d’ironie Déroule son histoire en criant aux cieux sourds.

Minute dans le temps, atome dans l’espace, Un jour ce globe mort, tombeau de ce qu’il fut, S’éparpille. – Plus rien – pas un nom – nulle trace.

Il n’est plus! Et tout va ! Quel était donc son but ? Où chercher le pourquoi de ce poignant mystère? – Les cieux sont éternels et bleus, il faut se taire.

André Vallias – as instituições estão funcionando

instituições

Jules Laforgue – O silêncio azul

Por todo o transcorrido eterno e no vindouro,
A Noite universal povoa-se infinita
E cegamente em coágulos onde se agita
A vida que rabisca em arabescos de ouro.

Eis que um daqueles, tão desassistido e só,
Junto a seus deuses, artes, erros e mania,
Seu lodaçal, miséria e cantos de ironia,
Escreve história, grita ao céu e vira pó.

No tempo, é um minuto; um átomo, no espaço,
E um dia o globo morto, tumba do que fora,
Some no nada, sem deixar o nome – ou traço.

Tudo se vai! E o que lhe fez viver outrora?
Onde encontrar sentido no dolente entrudo?
O céu, eterno e azul: melhor quedar-se mudo.

Trad.: André Valias

Le silence bleu

Depuis l’éternité passée et pour toujours,
La Nuit universelle en tous sens infinie
Se peuple aveuglément de blocs grouillants de vie,
En paraboles d’or entrelaçant leurs cours.

L’un d’eux, dans ces splendeurs perdu, seul, sans secours, Avec ses dieux, ses arts, ses erreurs, son génie, Ses fanges, sa misère et ses chants d’ironie Déroule son histoire en criant aux cieux sourds.

Minute dans le temps, atome dans l’espace, Un jour ce globe mort, tombeau de ce qu’il fut, S’éparpille. – Plus rien – pas un nom – nulle trace.

Il n’est plus! Et tout va ! Quel était donc son but ? Où chercher le pourquoi de ce poignant mystère? – Les cieux sont éternels et bleus, il faut se taire.

Heinrich Heine – Chegou a morte

Chegou a morte – agora vou
Dizer o que o orgulho não
Me permitiu: meu coração
Tão só por ti pulsou, pulsou.

Já estou fechado no ataúde,
Descem-me à cova. A calmaria
Me abraça enfim, mas tu, Maria,
Por mim irás, muito amiúde,

Chorar, e pra quê, afinal?
Consola-te, este é o destino
Humano: o que há de bom e fino
E grande sempre acaba mal.

Trad.: André Vallias

Es kommt der Tod

Es kommt der Tod — jetzt will ich sagen,
Was zu verschweigen ewiglich
Mein Stolz gebot: für dich, für dich,
Es hat mein Herz für dich geschlagen!

Der Sarg ist fertig, sie versenken
Mich in die Gruft. Da hab ich Ruh.
Doch du, doch du, Maria, du
Wirst weinen oft und mein gedenken.

Du ringst sogar die schönen Hände —
O tröste dich — Das ist das Loos,
Das Menschenloos: — was gut und groß
Und schön, das nimmt ein schlechtes Ende.

Goethe – Um Igual

Sobre cada monte
A calma,
Em cada fronde
Nem sinal
De brisa; calam-
-se os pássaros na floresta.
Espera! Em breve
Descansas em paz.

Trad.: André Vallias

Heinrich Heine – “Larga as parábolas sagradas”

Larga as parábolas sagradas,
Deixa as hipóteses devotas,
E põe-te em busca das respostas
Para as questões mais complicadas.

Por que se arrasta miserável
O justo carregando a cruz,
Enquanto, impune, em seu cavalo,
Desfila o ímpio de arcabuz?

De quem é a culpa? Jeová
Talvez não seja assim tão forte?
Ou será Ele o responsável
Por todo o nosso azar e sorte?

E perguntamos o porquê,
Até que súbito – afinal –
Nos calam com a pá de cal –
Isto é resposta que se dê?

Trad.: André Vallias

Percy Bysshe Shelley – Ozymandias

Disse o viajante de uma antiga terra:
“Duas pernas de pedra, no deserto,
Despontam gigantescas, e bem perto
Há um rosto destroçado que descerra
Os lábios num sorriso de comando
Que atesta: o escultor leu com mestria
Paixões que na matéria inerte e fria
A mão que as entalhou vão perdurando.
‘Meu nome é Ozymândias, rei dos reis:
Desesperai perante as minhas obras!’
Alerta uma inscrição no pedestal.
Mas são ruínas tudo o que ali sobra,
E um mar de areia, em árida nudez,
Circunda a decadência colossal”

Trad.: André Vallias