Andrew Marvell – To His Coy Mistress, em 5 traduções

PARA SUA DAMA RECATADA
trad. Matheus “Mavericco”

Houvesse tempo e espaço e então de fato
Não seria um delito este recato.
Sentados, nós iríamos pensar
Em só pensar no outro, e assim passar.
Você, do lado indígena do Ganges,
Achando rubis, e eu, pois me confrange
A dor, junto ao Humber. Décadas antes
Do Dilúvio eu te juro amor, e, instantes
Depois, se quiser, negue os votos meus
Até que se convertam os judeus.
Meu amor vegetal cresce mais vasto,
Embora mais lento, que impérios; gasto
Séculos em louvor de tua face
E mais dois longos séculos em face
De teus seios e trinta mil se quero
O corpo inteiro. Uma era de esmero
Pra cada parte, até que a derradeira
Sirva pra revelar tua alma inteira.
Pois você, ó Senhora, é digna disto ―
E eu não sei amar por menos que isto.

Contudo, escuto sempre atrás de mim
O Tempo alado a toda pressa: e, assim,
Nós só podemos ver, mais adiante,
A vastidão deserta do incessante
E a graça que você tem hoje, extinta.
No teu fosso marmóreo é indistinta
Minha canção que ecoa; o verme tenta
Romper teu corpo virgem e fragmenta
Em pó a tua honra imensa, enquanto
Meu ardor queima em cinzas. Se o recanto
Da sepultura é íntimo, então, acho,
Ninguém lá deve dar algum abraço.

Mas agora, o vigor juvenil posto
Tal como o orvalho fresco no teu rosto,
Tua alma desejosa de que sue
Em cada poro o fogo que a imiscui,
Devoremos nós dois juntos, e agora,
Como um casal de abutres que se adora,
O tempo antes que o tempo venha a ser
O nosso algoz, voraz o seu poder.
Enovelemos rapidez e força
Num globo, para que depois se torça
E abata o nosso anseio em árdua lida
Diante dos portões de aço da vida:
Assim, se o sol não puder ser parado,
Ele será ao menos apressado.

**********************************

À SUA AMIGA ESQUIVA
trad. Nelson Ascher

Sobrassem mundo e tempo, não seria
tanta esquivez, senhora, uma heresia.
Sentar-nos-íamos pensando, a cada
longo dia de amor, uma jornada.
Enquanto junto ao Ganges encontrasses
rubis, eu molharia minhas faces
chorando ao Humber. Fosse minha parte
dez anos antes do Dilúvio amar-te,
seria a tua opor desinteresse
até que o povo hebreu se convertesse.
Meu amor vegetal, mais devagar
que impérios, cresceria sem parar.
Dedicaria cem anos, perante
teus olhos, a louvar o teu semblante;
A te adorar os seios, pelo menos
O dobro; ao resto, mais trinta milênios;
E, a tudo em ti, mil eras, de maneira
A abrir teu coração na derradeira.
Porque, senhora, vales tal quantia
E, para amar-te, eu não regatearia.

Mas ouço atrás de mim, correndo insanos
num carro alado, os dias, meses, anos.
E, frente a nós, se estende sem mais nada
A vasta eternidade desolada.
Tua beleza há de perder-se ao léu;
tampouco, em teu marmóreo mausoléu,
hão de ecoar meus versos quando, inerme,
entregues o hímen obstinado ao verme,
que em pó transformará tua honra vã
E em cinzas todo o ardor do meu afã.
O túmulo é discreto e acolhedor
mas lá ninguém que eu saiba faz amor.

Agora, então, que em tua pele pousa,
feito orvalho na folha, a cor viçosa,
E em cada poro de tua alma aflora
um fogo urgente ― amemos sem demora:
mais vale devorarmos, com o brio
das aves de rapina em pleno cio,
O tempo de uma vez do que, em poder
das lentas presas dele, enlanguescer.
Unindo numa esfera dois extremos
― nossa ternura e força ― arrebatemos
prazeres com porfia desabrida
através dos portões férreos da vida.
Não há como parar o sol, mas nós
podemos ― sim ― torná-lo mais veloz.

**********************************

PARA SUA AMADA ESQUIVA
trad. Alípio Correia Neto

Com um mundo nosso, dama, e vez,
Não fora um crime tua esquivez.
Íamos sentar, pra ver qual via
Trilhar, e amar por longo dia.
Acharias, com o Ganges aos pés,
Rubis; eu, o pranto, ante as marés
Do Humber. Te daria dez anos
De amor antediluvianos!
Dirias não, por caprichos teus,
Até à conversão dos judeus;
Meu amor vegetal, mais lento
Que impérios, vasto em crescimento,
Um século pra louvações
Aos olhos, pra admirar feições,
Teria; o dobro pra adorar-te
Os seios; trinta mil às mais partes;
A cada qual, uma era, e então
Uma última, a teu coração.
Pois, dama, vales os meus reinos;
E eu não iria te amar por menos.

Mas ouço, sempre, atrás de nós,
O Carro do Tempo, veloz,
E adiante jazem vastos ermos
Da eternidade. Não havemos
De achar tua beleza afora.
Nem, na tua cripta marmórea,
Soará meu canto. E um verme há de
Testar-te a longa virgindade,
Mudando em pó tua honra altiva
E em cinzas a minha lascívia.
A cova é bom e íntimo espaço,
Mas não, penso eu, para um abraço.

Enquanto há em ti cor juvenil
Na tez, como na flor, rocio,
E a alma que anseia deita fora um
Fogo urgente em cada poro,
Vamos folgar, e semelhantes
A amáveis aves rapinantes,
Tragar o nosso tempo, isentos
De enlanguescer num bico lento,
Então enrolar nosso desvelo
E forças em um só novelo,
Rasgar prazeres na investida
Contra os portões férreos da vida.
Assim, sem termos o que impeça
O sol, o instamos a ir depressa.

**********************************

PARA SUA TÍMIDA SENHORA
trad. Rodrigo Garcia Lopes

Com mundo e tempo de sobra, acredite-me,
Senhora, essa tua timidez não seria crime.
Sentados, pensaríamos no modo melhor
De gozar nosso longo dia de amor.
Tu pelas margens do Ganges
Acharia rubis, eu, no estuário langue
Do Humber, reclamaria de tudo.
Te amaria dez anos antes do Dilúvio,
E tu, se quisesses, recusarias meu eu
Até a conversão dos Judeus.
Meu amor vegetal iria assim crescendo
Mais vasto que impérios, e mais lento;
Cem anos gastos para elogiar
Teus olhos, e tua testa contemplar;
Duzentos para adorar cada seio,
Mas trinta mil para seu recheio;
Uma era ao menos para cada seção,
E a última exibiria enfim seu coração.
Senhora, bem mereces tal status.
Recusaria te amar por mais barato.

Mas ouço às nossas costas de repente
O carro alado do tempo, rente;
E além de nós ardem na tarde
Desertos de vasta eternidade.
Tua beleza, hoje, amanhã não será,
Nem na lápide marmórea há de soar
O eco dessa canção; só vermes sem piedade
A devorar tão protegida virgindade,
E tua honra antiquada virando pó,
E cinzas todo meu desejo, a sós:
A cova é discreta e confortável alcova,
Mas que amantes ali se abracem, não há prova.

Agora, enquanto a cor em suas maçãs
Pousa em tua pele como rocio da manhã,
E enquanto tua alma transpire de desejo
E em seus poros fogos sutis revejo,
Vamos nos acabar enquanto é de matina,
E já, como amorosas aves de rapina,
De uma vez devorar o nosso tempo
Em vez de enlanguescer em seu relento.
Enrolemos nossa força, sem espera,
Nossa ternura toda numa só esfera,
E rasguemos prazeres com luta ríspida,
Ao passar pelos portões de ferro da vida;
Pois, se não podemos o sol deter
Podemos ao menos fazê-lo correr.

**********************************

À SUA TÍMIDA AMANTE
trad. Renato Suttana

Houvesse, dama, tempo e mundo à farta,
E tal reserva não seria crime.
Sentados, a escolher nosso caminho,
Do amor o longo dia passaríamos.
Buscarias rubis junto das margens
Do indiano Ganges: e eu entoaria
Junto às ondas do Humber que te amara
Por mais dez anos, até a inundação.
Eis que o recusarias, caprichosa,
Do judeu a esperar a conversão.
Meu amor, como planta, medraria
Mais vasto que os impérios e mais lento:
E cem anos passara eu a louvar
Os teus olhos, mirando a tua fronte,
E a adorar cada seio mais duzentos,
Mais trinta mil para o restante – uma era
Enfim inteira para cada parte:
E o coração revelarias na última.
Pois que és digna, senhora, de tal corte –
E a menor preço eu não quisera amar.

Mas ouço às minhas costas, sempre, a alada
Carruagem do tempo se apressando;
E à minha frente em tudo vejo abrir-se
Só desertos de vasta eternidade.
Tua graça não mais existirá,
Nem meu canto soará sob a marmórea
Abóbada; só os vermes provarão
Essa há tanto guardada virgindade:
E a tua inútil honra será pó,
E todo o meu desejo apenas cinza:
Que a sepultura é cômodo e privado
Lugar, mas às carícias – creio – impróprio.

Por isso, enquanto a cor da juventude
Como o orvalho da aurora em tua pele
Repousa e cada poro da anelante
Alma um fogo incessante ainda transpira:
Vamos gozar, enquanto nos é dado,
E devorar como aves de rapina
De uma só vez nosso tempo, sem sermos
Em suas lentas garras abatidos.
Rolemos nossa força e toda a nossa
Doçura para dentro de um só globo –
E o gozo em luta rude laceremos
Contra os portões de ferro da existência:
Pois, se este sol não podemos parar,
Que o façamos então acelerar.

**********************************

TO HIS COY MISTRESS

Had we but world enough and time,
This coyness, lady, were no crime.
We would sit down, and think which way
To walk, and pass our long love’s day.
Thou by the Indian Ganges’ side
Shouldst rubies find; I by the tide
Of Humber would complain. I would
Love you ten years before the flood,
And you should, if you please, refuse
Till the conversion of the Jews.
My vegetable love should grow
Vaster than empires and more slow;
An hundred years should go to praise
Thine eyes, and on thy forehead gaze;
Two hundred to adore each breast,
But thirty thousand to the rest;
An age at least to every part,
And the last age should show your heart.
For, lady, you deserve this state,
Nor would I love at lower rate.

But at my back I always hear
Time’s wingèd chariot hurrying near;
And yonder all before us lie
Deserts of vast eternity.
Thy beauty shall no more be found;
Nor, in thy marble vault, shall sound
My echoing song; then worms shall try
That long-preserved virginity,
And your quaint honour turn to dust,
And into ashes all my lust;
The grave’s a fine and private place,
But none, I think, do there embrace.

Now therefore, while the youthful hue
Sits on thy skin like morning dew,
And while thy willing soul transpires
At every pore with instant fires,
Now let us sport us while we may,
And now, like amorous birds of prey,
Rather at once our time devour
Than languish in his slow-chapped power.
Let us roll all our strength and all
Our sweetness up into one ball,
And tear our pleasures with rough strife
Thorough the iron gates of life:
Thus, though we cannot make our sun
Stand still, yet we will make him run.

in https://escamandro.wordpress.com/2015/01/07/to-his-coy-mistress-de-andrew-marvell-pt-2-por-matheus-mavericco/

REPUBLICAÇÃO: poema originalmente publicado na página em 01/03/2016

Katherine Barrett Swett – Cabelos brilhantes

Cabelos Brilhantes

que esse artifício pudesse ser um meio1
-John Donne

Quando me enterrar, por favor, ponha
o cabelo de nossa filha em meu punho;
assim, algum arqueólogo,
que por acaso escave minha sepultura,
encontrará esse cacho, que não se tornou grisalho
durante todos os anos que se passaram
entre minha morte e a dela.
Espero que ela possa experimentar
o choque da imortalidade
que senti ao vasculhar velharias
e encontrar uma mecha de cabelos castanhos atada,
anos antes, com um fio vermelho-vivo,
enrolada em posição fetal dentro
de um pote de maionese Hellmann’s.
Espero que esse estudioso compreenda
exatamente o que meu esqueleto tem em mãos,
e encontre a linguagem para expressar,
com a precisão de um fio de cabelo,
que tudo o que temos são palavras e carnes.

Trad.: Nelson Santander

  1. Trecho do poema “The Relic”, de John Donne em tradução livre e literal. ↩︎

Mais do que uma leitura, uma experiência. Clique, compre e contribua para manter a poesia viva em nosso blog

Bright Hair

that this device might be some way
-John Donne

When you bury me, please place
our daughter’s hair inside my fist;
that way some archaeologist,
who happens to unearth my grave,
might find this lock, not turned to gray
in all the intervening years
between my death and my daughter’s.
I hope she’ll be the kind to feel
the shock of immortality
I felt when sorting through old stuff
to find a hank of brown hair tied
some years before with bright red yarn
and curled up fetally inside
a Hellmann’s mayonnaise jar.
I hope that scholar understands
just what my skeleton has in hand,
and finds the language to express
closer by that hair’s breadth
that all we have are words and flesh.

Tony Connor – Na Alameda dos Carvalhos

Velha e sozinha, à noite ela adormece
sentada diante da televisão.
A casa está quieta agora. Ela tece,
ergue-se para ferver a infusão,

assiste a um cowboy ser assassinado,
lê na gazeta quem nasceu ou morreu,
dorme em ‘Mísseis nucleares estocados’.
Um mundo que um mal pior prometeu

some. Sonha com uma vida passada
na mesma casa: de novo o sofrimento,
pobreza, doença, a sorte negada,
a morte de um filho, o derretimento

do cérebro de um irmão que enlouqueceu.
Setenta anos de aflições; a chaleira
chia. À meia-noite, ela ora, servil,
tira a dentadura e junta suas tranqueiras.

Trad.: Nelson Santander

Mais do que uma leitura, uma experiência. Clique, compre e contribua para manter a poesia viva em nosso blog

In Oak Terrace

Old and alone, she sits at nights
nodding before the television.
The house is quiet now. She knits,
rises to put the kettle on,

watches a cowboy’s killing, reads
the local Births and Deaths, and falls
asleep at ‘Growing stockpiles of war-heads’.
A world that threatens worse ills

fades. She dreams of a life spent
in the one house: suffers again
poverty, sickness, abandonment,
a child’s death, a brother’s brain

melting to madness. Seventy years
of common trouble; the kettle sings.
At midnight she says her silly prayers,
and takes her teeth out, and collects her night-things.

Mary Ruefle – Meu amigo moribundo

Eu visitava um amigo moribundo no hospital e passei por um quarto cheia de bebês que ainda não tinham recebido nomes. Todos estavam alinhados em uma fileira, como projetos científicos. Aqueles que tinham nomes ganharam uma pulseira e foram levados embora. Mas os que ficaram eram bastante interessantes, a julgar pela tristeza já evidente em seus traços. Como devo te chamar, pequeno cordeiro deitado aqui nesse leito de algodão? Detive uma pessoa de uniforme que estava familiarizada com eles: “Volte amanhã”, ela disse, “todos já terão partido”.

Trad.: Nelson Santander

Mais do que uma leitura, uma experiência. Clique, compre e contribua para manter a poesia viva em nosso blog

My Dying Friend

I was visiting a dying friend in the hospital and passed by a room full of babies who had not yet been given names. They were all lined up in a row, like science projects. Those with names had won a bracelet and been taken away. But those who remained were quite interesting, judging by the sadness already evident in their features. What do I call thee, little lamb lying here on a bed of cotton? I stopped someone in a uniform who was familiar with them. “Come back tomorrow,” she said, “they will all be gone”.

Francis Ledwidge – A um pardal

Porque não temes te misturar
Com asas mais proeminentes,
Como eu, com minha voz vou cantar
Teu doce coração imprudente.

E quando penas mais afetadas
Vão onde o estio em folhas se inscreve,
Ainda vens até nós do nada,
Como folhas cinzentas na neve.

Nas vielas, entre as ninharias,
Desces para tuas refeições,
Conhecendo cada gelosia
Lascada de teus anfitriões.

Não há ave tão inofensiva,
Ou tão doce e rude como tu,
Tão comum e tão inexpressiva,
Ou tão autêntica como tu.

Não és perfeito, estou ciente,
Mas te amo, pois nunca nos foge,
Ainda que o inverno te açoite,
E a neve já no morro se aloje.

Trad.: Nelson Santander

Mais do que uma leitura, uma experiência. Clique, compre e contribua para manter a poesia viva em nosso blog

To a Sparrow

Because you have no fear to mingle
Wings with those of greater part,
So like me, with song I single
Your sweet impudence of heart.

And when prouder feathers go where
Summer holds her leafy show,
You still come to us from nowhere
Like grey leaves across the snow.

In back ways where odd and end go
To your meals you drop down sure,
Knowing every broken window
Of the hospitable poor.

There is no bird half so harmless,
None so sweetly rude as you,
None so common and so charmless,
None of virtues nude as you.

But for all your faults I love you,
For you linger with us still,
Though the wintry winds reprove you
And the snow is on the hill.

William Shakespeare – do Macbeth (excerto)

Amanhã
amanhã amanhã amanhã
Rasteja em passo parco dia a dia
Até a última sílaba do Tempo.
E os ontens, todos, só nos alumiam
O fim no pó. Apaga, apaga, vela
Breve!
A vida é só uma sombra movel.
             Pobre ator
Que freme e treme o seu papel no palco
E logo sai de cena. Um conto tonto
Dito por um idiota – som e fúria, signi-
Ficando nada.

     Trad.: Augusto de Campos

 

REPUBLICAÇÃO: poema originalmente publicado na página em 27/02/2016

Edward Thomas – Foi-se embora, uma vez mais

Foi-se embora, uma vez mais,
Maio, junho e também
Julho, e agosto se esvai,
De novo, como convém,

Banais, salvo pelo fato
De vê-los passar, tal qual
Atravessam os regatos
Um vago cais fluvial.

E no presente também,
Sob as chuvas da estação,
as laranjas de Blenheim
Caem sujas pelo chão,

Como nos meus anos idos —
O perdido era presente —
A guerra mudando os
Jovens em fertilizante.

Veja o velho casarão,
Arcaico em sua altivez,
Ermo e na escuridão,
A relva crescendo em vez

Das batalhas, do respeito,
Da vida sempre a marchar;
Repousaram em seus leitos
Juventude, amor, pesar:

Sou parecido com isso;
Só que à vida sigo preso,
Respiro e me interesso
Pelo casarão aceso: —

Sou exatamente assim:
Sem vidraças ou janelas
Para alunos darem fim —
Já quebraram todas elas.

Trad.: Nelson Santander

Mais do que uma leitura, uma experiência. Clique, compre e contribua para manter a poesia viva em nosso blog

Gone, Gone Again

Gone, gone again,
May, June, July,
And August gone,
Again gone by,

Not memorable
Save that I saw them go,
As past the empty quays
The rivers flow.

And now again,
In the harvest rain,
The Blenheim oranges
Fall grubby from the trees,

As when I was young—
And when the lost one was here—
And when the war began
To turn young men to dung.

Look at the old house,
Outmoded, dignified,
Dark and untenanted,
With grass growing instead

Of the footsteps of life,
The friendliness, the strife;
In its beds have lain
Youth, love, age, and pain:

I am something like that;
Only I am not dead,
Still breathing and interested
In the house that is not dark:—

I am something like that:
Not one pane to reflect the sun,
For the schoolboys to throw at—
They have broken every one.

Grey Gowrie – Terceiro Dia

Os respiradores soam como trutas se alimentando
à noite em algum criadouro da imaginação –
ninguém ali para ouvir; nosso subaquático mundo de atenção
intensiva é quase azul – inofensivo, brando.

Óculos contra o vidro, os especialistas
passam para nos examinar, e são parelhos
até que entram com suas máscaras: listas
em pranchetas distinguem os nomes dos aparelhos.

Somos nossa medicação, e os equipamentos
programados para cada paciente, individualmente,
são mais do que nossa identidade no momento.
Podemos ter sido; alguns podem sê-lo novamente.

Não temos um rosto a perder, para olhar,
mas é agradável aqui, suspense suspenso, nada a fazer
por ora – o tempo é o que conseguimos obter
para lutar por um novo nascimento, e por ar.

Trad.: Nelson Santander

Mais do que uma leitura, uma experiência. Clique, compre e contribua para manter a poesia viva em nosso blog

Third Day

Respirators sound like trout feeding
at night in some dream hatchery – no one there
to listen; our subaqueous world of care
is halfway blue – peaceful, unthreatening.

Spectacles pressed to the glass, our specialists
walk by to look us over and seem the same
until, mask-mouthed, they enter: clipboard lists
distinguish the paraphernalia from the name.

We are our medication, and the machines
programmed to meet an individual case
more than identity now. We may have been;
some may become again. We have no face

to lose, to look at, but it’s pleasant here,
suspense suspended, nothing to be done
for the time being – time being our time won
to flail for birth again and fight for air.

Gwendolyn MacEwen – A Descoberta

não fiques pensando que a exploração
termina, que ela revelou todo seu mistério
ou que o mapa que tens em mãos
inibe novas descobertas

advirto-te que desvendá-la leva anos,
séculos, e quando a vires nua,
olha de novo,
admite que há algo além, inominável,
um véu, uma película sobre a carne
que teu desejo, por si só, não pode remover

quando vires a terra nua, olha de novo
(queima teus mapas, não é disso que falo),
quero dizer, quanto tudo parecer mais evidente,
é aí que deves começar de novo

Trad.: Nelson Santander

Mais do que uma leitura, uma experiência. Clique, compre e contribua para manter a poesia viva em nosso blog

The Discovery

do not imagine that the exploration
ends, that she has yielded all her mystery
or that the map you hold
cancels further discovery

I tell you her uncovering takes years,
takes centuries, and when you find her naked
look again,
admit there is something else you cannot name,
a veil, a coating just above the flesh
which you cannot remove by your mere wish

when you see the land naked, look again
(burn your maps, that is not what I mean),
I mean the moment when it seems most plain
is the moment when you must begin again

Joyce Sutphen – Meu pai, morrendo

Foi um trabalho árduo, morrer, mais árduo
que qualquer coisa que ele já fizera.

Qualquer tarefa brutal, esmagadora, de arrebentar
as costas, que ele se obrigara

a suportar — nada
se comparava a isso. E levou

tanto tempo. Quando o trabalho
terminaria? Quem o chamaria

para o jantar? E foi
duro para nós (seus filhos) —

por toda vida ouvimos
nossa mãe nos dizer: vão,

ajudem seu pai, mas esta
era uma tarefa que não podíamos cumprir.

Ele já estava longe demais,
num campo inalcançável para nós.

Trad.: Nelson Santander

Mais do que uma leitura, uma experiência. Clique, compre e contribua para manter a poesia viva em nosso blog

My Father, Dying

It was hard work, dying, harder
than anything he’d ever done.

Whatever brutal, bruising, back-
breaking chore he’d forced himself

to endure—it was nothing
compared to this. And it took

so long. When would the job
be over? Who would call him

home for supper? And it was
hard for us (his children)—

all of our lives we’d heard
my mother telling us to go out,

help your father, but this
was work we could not do.

He was way out beyond us,
in a field we could not reach.