Para Barbara Torunczyk
Aprecias as palavras como um tímido ilusionista aprecia o momento de quietude
depois de deixar o palco, sozinho em um camarim onde
uma vela amarela arde com sua chama oleosa e negra como breu?
Que anseio te impulsionará a empurrar o pesado portão, a sentir
uma vez mais o cheiro daquela madeira e o gosto ferroso da água de um antigo poço,
a ver novamente a pereira altaneira, a matrona orgulhosa que nos presenteava
aristocraticamente com seus frutos perfeitamente formados a cada outono,
e depois caía na muda expectativa pelos males do inverno?
Ao lado, a impassível chaminé da fábrica fumegava, e a feia cidade permanecia quieta,
mas a terra fértil e infatigável trabalhava sob os tijolos dos jardins,
nossas memórias sombrias e a vasta despensa dos mortos.
Quanta coragem é necessário reunir para abrir o pesado portão,
quanta coragem para nos vermos de novo,
reunidos na pequena sala sob uma lâmpada gótica?
A mãe folheia o jornal, as mariposas chocam-se contra as vidraças,
nada acontece, nada, apenas a noite, a oração; ficamos à espera…
Só se vive uma vez.
Trad.: Nelson Santander a partir da versão do poema em inglês traduzido por Clare Cavanagh
Gate
To Barbara Torunczyk
Do you love words as a shy magician loves the moment of quiet
after he’s left the stage, alone in a dressing room where
a yellow candle burns with its greasy, pitch-black flame?
What yearning will encourage you to push the heavy gate, to sense
once more the odor of that wood and the rusty taste of water from an ancient well,
to see again the tall pear tree, the proud matron who presented us
aristocratically with its perfectly formed fruit each fall,
and then fell into mute anticipation of the winter’s ills?
Next door a factory’s stolid chimney smoked and the ugly town kept still,
but the indefatigable earth worked on beneath the bricks in gardens,
our black memory and the vast pantry of the dead, the good earth.
What courage does it take to budge the heavy gate,
what courage to catch sight of us again,
gathered in the little room beneath a Gothic lamp –
mother skims the paper, moths bump the windowpanes,
nothing happens, nothing, only evening, prayer; we wait . . .
We lived only once.