Não sou sua mãe, não me comoverei
com o sofrimento ou a gratidão de homens
que lamentam como órfãos à minha porta.
Não sou uma igreja. Não respondo às
orações, mas nunca as rejeito.
Entre e ajoelhe-se, sente-se ou fique de pé,
o peso de seu fardo não diminuirá,
não importa o tempo de sua permanência.
Diga-me o que quiser, eu tenho que ouvir,
mas não espere que eu responda
quando você me contar que perdeu o emprego
ou que sua esposa encontrou um outro amor
ou que seus filhos levaram seus risos
para outra cidade. Você se sente só e vazio?
Estou surpresa. Nem reparei que eles tinham partido.
Apesar da fila de faces fixadas como medalhas
em minhas paredes, eu não as mereci.
Os arranhões na madeira não são minhas cicatrizes.
Se houver um cheiro de especiarias no ar,
culpe os truques da cozinha
ou seu triste vício nos dias passados, que
nunca perduram, não importa o quanto você
acredite que sim. Não sou uma cápsula do tempo.
Não dou valor a coisas insignificantes como mechas
de cabelo, dentes de leite, canhotos de ingressos
e alianças de compromisso — meras partículas
de poeira que eu sopraria para a rua se pudesse
espirrar. Tire seu uniforme do colégio
e o vestido de noiva de sua mulher de perto
de mim. O apego sentimental me incomoda.
Então, vá embora, velho sofá que chora
moedas ao ser arrastado para a varanda.
Adeus, cama fria que quebra seus ossos
em protesto ao despejo, execução hipotecária ou
qualquer que seja a causa desse sinistro desfile
de partidas. Não sou um animal de estimação. Não sinto
o abandono. Às vezes, nem vejo você
chegar, sair ou ficar para trás. Minhas janelas
são seus olhos, não os meus. Se você morrer
dentro de mim, deixarei que você conte
aos vizinhos. Desligue os aquecedores,
não tenho medo do frio. Não sou aquela
que se encontra em um canto no chão
porque o que quer que tenha feito você pensar
que este era um lar caloroso não está mais aqui
para falar com você. Não me olhe
desta forma, não sou a culpada. Não concedi
nada ao imigrante ou ao exilado
que não tenha concedido a um coiote1 ou a um natural
da terra. Não sou um prêmio ou um desejo realizado.
Não sou um castelo de conto de fadas. Embora
já tenha sido, em alguma terra distante habitada
por sonhadores agora extintos. Quem sabe
o que aconteceu lá? Em todo caso, desejo-lhe
uma boa viagem, fantasias grotescas e alegria.
Até mais, disfarce de parede a parede em camurça
vulgar e chita. Cuide-se, seu tolo,
e não se esqueça de que sou apenas uma casa,
uma estrutura sem alma para aqueles cujos
santos padroeiros são a saudade e o desespero.
Trad.: Nelson Santander
N. do T.: 1. “Coiotes” são traficantes de pessoas que operam, frequentemente em redes criminosas, ajudando indivíduos a atravessar ilegalmente fronteiras, especialmente a fronteira entre o México e os Estados Unidos. Essas atividades são ilegais e podem ser perigosas para os migrantes, envolvendo riscos significativos. O termo é amplamente utilizado para descrever aqueles que facilitam a migração ilegal, muitas vezes cobrando somas substanciais em troca de seus serviços.
Casa
I am not your mother, I will not be moved
by the grief or gratitude of men
who weep like orphans at my door.
I am not a church. I do not answer
prayers but I never turn them down.
Come in and kneel or sit or stand,
the burden of your weight won’t lessen
no matter the length of your admission.
Tell me anything you want, I have to listen
but don’t expect me to respond
when you tell me you have lost your job
or that your wife has found another love
or that your children took their laughter
to another town. You feel alone and empty?
Color me surprised! I didn’t notice they were gone.
Despite the row of faces pinned like medals
to my walls, I didn’t earn them.
The scratches on the wood are not my scars.
If there’s a smell of spices in the air
blame the trickery of kitchens
or your sad addiction to the yesterdays
that never keep no matter how much you believe
they will. I am not a time capsule.
I do not value pithy things like locks
of hair and milk teeth and ticket stubs
and promise rings—mere particles
of dust I’d blow out to the street if I could
sneeze. Take your high school jersey
and your woman’s wedding dress away
from me. Sentimental hoarding bothers me.
So off with you, old couch that cries
in coins as it gets dragged out to the porch.
Farewell, cold bed that breaks its bones
in protest to eviction or foreclosure or
whatever launched this grim parade
of exits. I am not a pet. I do not feel
abandonment. Sometimes I don’t even see you
come or go or stay behind. My windows
are your eyes not mine. If you should die
inside me I’ll leave it up to you to tell
the neighbors. Shut the heaters off
I do not fear the cold. I’m not the one
who shrinks into the corner of the floor
because whatever made you think
this was a home with warmth isn’t here
to sweet-talk anymore. Don’t look at me
that way, I’m not to blame. I granted
nothing to the immigrant or exile
that I didn’t give a bordercrosser or a native
born. I am not a prize or a wish come true.
I am not a fairytale castle. Though I
used to be, in some distant land inhabited
by dreamers now extinct. Who knows
what happened there? In any case, good
riddance, grotesque fantasy and mirth.
So long, wall-to-wall disguise in vulgar
suede and chintz. Take care, you fool,
and don’t forget that I am just a house,
a structure without soul for those whose
patron saints are longing and despair.