Ida Vitale – Peixe na água

                        PEIXE NA ÁGUA

Como peixe na água,
como peixe, porém, pensado por Leibniz1:

peixe pleno de lago,
de lago pleno de peixes,
peixe infinito pleno de lagos infinitos
à margem de um eu infinito.
Então sim,
como um peixe na água
de um lago
de outro mundo onde
as
la(c)gunas
não nos
dilacerem.

Trad.: Nelson Santander

  1. A menção a Leibniz (1646-1716) evoca seu conceito de monadologia, segundo o qual o universo é composto por ‘mônadas’ — unidades indivisíveis que contêm em si uma representação do todo. No poema, essa ideia se manifesta no peixe que contém lagos infinitos, espelhando a noção leibniziana de que cada ser carrega em si reflexos do universo inteiro. A referência também sugere a ‘harmonia preestabelecida’ pensada pelo filósofo, que se relaciona com o ‘outro mundo’ evocado nos versos finais, onde as fragmentações deixam de existir – embora, ironicamente, seja nos versos finais que o poema mais se fragmenta visualmente, ao mimetizar o movimento das águas e o pervagar dos peixes. O que sugere que a completude está apenas no conceito – enquanto o fluxo da realidade e da linguagem é, por natureza, dinâmico e fragmentado. ↩︎

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                        PEZ EN EL AGUA

Como pez en el agua,
como pez, empero, pensado por Leibniz:

pez lleno de lago,
de lago lleno de peces,
pez infinito lleno de lagos infinitos,
a la orilla de un sí mismo infinito.
Entonces sí,
como pez en el agua
de un lago
de otro mundo donde
no
nos
laceren
lagunas.