Às vezes, do nada, lembro do poder
da casa dela, e do caminho até lá
descendo a rua estreita, a curva acentuada
à direita, abrindo-se para
a agradável rua sem saída, a
casa da minha melhor
amiga — o quê?
Estilo italiano? Janelas ogivais,
varandas, telhado,
o terreno íngreme atrás, descendo
suavemente ate a baía. E depois
as pedras planas até o pórtico
dórico — entre elas, ervas daninhas floridas,
sem erva-do-orvalho, sem hera, apenas
pequenas flores, então lá estava, como uma mansão,
um pequeno palacete de Berkeley, a elegante
casa de um médico, segura, onde ela estava
morrendo, com 9 anos de idade, e eu não
me permiti perceber.
Se a mãe dela estivesse lá, talvez eu pudesse ter
pedido para tirar um cochilo
com minha amiga quando ela
adormecesse — mas a mãe dela
havia morrido no dia anterior, meu trabalho
era não deixar minha amiga saber —
para que ela pudesse morrer acreditando que ainda tinha
uma mãe. O que eu não teria dado para
ter sido autorizada a me deitar ao lado
de seu querido corpo esquelético.
Ela ainda tinha seus finos cabelos amarelo-esverdeados,
densos, de tonalidade acre,
como se o veneno de chumbo que elas respiraram tivesse
acentuado seu tom verde-limão —
O que eu não teria dado para
ser autorizada a adormecer com ela
e sonhar, viva — o que eu não daria
agora? Nada, não tenho nada para dar,
nada da sorte que acompanhou minha vida afortunada
Mas rezo para que esta noite eu durma e que,
9 e 9 anos, possamos nos abraçar em um
sonho verde.
Trad.: Nelson Santander
OLDS, Sharon Balladz. New York: Alfred A. Knopf, 2022. p. 119-121
Best Friend Ballad
Sometimes I’ll suddenly remember the power
of her house, and of the approach to it,
down the narrow, extreme-curve-to-the-
right street, opening onto the
somehow delicate cul-de-sac, my
best friend’s
house—what?
Italianate? Ogive windows,
balconies, tile roof,
the land fallen off steep behind it to the
gradual slope to the Bay. And then
the flat stones up to her Doric
portico—between them, flowering
weeds, no ice plant, no ivy, just tiny
blossoms, then there it was, like a villa,
a little Berkeley palace, a doctor’s
elegant home of safety where she was
dying, 9 years old, and I didn’t
let myself realize it.
If her mother had been there, maybe I could have
asked her if I could take a nap
with my friend when she fell
asleep—but her mother
had died the day before, my job
was to not let my friend know it—
so she could die as if she had
a mother. What would I have given to
have been allowed to lie down
next to her dear skeletal body.
She still had her fine, yellow-green,
thick, sour-color hair,
as if the lead poison they’d breathed had
sharpened the chartreuse of it—
what would I have given to be
allowed to fall asleep with her
and dream, alive—what would I give
now? Nothing, I have nothing to give,
none of the luck which followed in my fortunate
life. But I pray for a sleep tonight in which,
9 and 9, we can hold each other in a
green dream.