Aparece, sempre aparece, quando menos o esperas.
Imaginas que morreste e, no entanto, quem se levanta
todos os dias em teu próprio leito, depois das insônias
e dos pesadelos, és tu mesmo, que por alguma razão
que não entendes continuas vivo, como em um filme
de Coixet1, minha vida sem mim, ou a vida secreta
das palavras, que são agora a única coisa que tens.
Sempre aparece, aquele fútil fantasma que atende
pelo teu nome, e se comporta com certa naturalidade
e independência. Outros diriam sensatez. Tu
sabes, somente tu, que é falsa essa vida que o personagem finge,
que vai e que vem e que às vezes não atende ao telefone
dos amigos, se é que algum liga, para que pensem
que morreu. A verdade é conhecida apenas por ti, mas o outro,
que não és tu, mas pode parecer, tem vida própria,
às vezes se comporta como tu antes de morrer,
e pode até ser brilhante em uma conversa
banal ou talvez em um jantar formal.
Tu o conheces porque é tu mesmo
quando ainda estavas vivo e circulavas pela cidade,
tomavas o metrô, ias ao cinema,
escrevias em fotologs e comentavas, sempre com acidez,
tua vida e a vida do mundo dos outros. Agora eles
creem que ainda estás vivo, mas tu sabes
a verdade: já faz muito tempo
que morreste, embora
alguém com o mesmo corpo que o teu ainda habite
tua casa, mal se alimente e espere, sempre espere
que a dignidade o impeça de morrer de velhice,
sem memória, como um brinquedo quebrado e inútil
que o tempo pisoteia e abandona.
Trad.: Nelson Santander
- Isabel Coixet é uma renomada diretora e roteirista espanhola, conhecida por seu estilo intimista e introspectivo. Seus filmes frequentemente exploram temas de solidão, identidade e comunicação, o que se alinha com a reflexão profunda e melancólica do eu lírico no poema. ↩︎
No sé si será un sueno
Acude, siempre acude, cuando menos lo esperas.
Imaginas que has muerto y sin embargo el que se levanta
cada día en tu propio lecho, después de los insomnios
y de las pesadillas, eres tú mismo, que por alguna razón
que no entiendes sigues vivo, como en una película
de la Coixet, mi vida sin mí, o la vida secreta
de las palabras, que son ahora lo único que tienes.
Siempre acude ese vano fantasma que atiende
por tu nombre y se comporta con cierta naturalidad
e independencia. Otros dirían cordura. Tú
sabes, solo tú, que es mentira esa vida que finge el personaje,
que va y que viene y que a veces no coge el teléfono
a los amigos, si es que alguno llama, para que crean
que ha muerto. La verdad solo la sabes tú, pero el otro,
que no eres tú, pero puede parecerlo, tiene vida propia,
a veces se comporta como tú antes de morir,
y puede ser hasta brillante en una conversación
banal o acaso en una cena de compromiso.
Tú lo conoces porque eres tú mismo
cuando aún estabas vivo y paseabas por la ciudad,
tomabas el metro, acudías a las salas de cine,
escribías en fotologs y comentabas, siempre con acidez,
tu vida y la vida del mundo de los otros. Ahora ellos
creen que aún sigues vivo, pero tú sabes
la verdad: hace ya mucho tiempo
que te has muerto, a pesar que todavía
alguien con tu mismo cuerpo sigue habitando
tu casa, apenas se alimenta y espera, siempre espera
que la dignidad le impida morir de viejo,
sin memoria? como un juguete roto e inservible
que el tiempo pisotea y abandona.