José Infante – Corpo estranho

Corpo Estranho

Para Rafael Inglada,
Ele sabe por quê.

Como é lógico e natural que aconteça,
meu corpo vem mudando ao ritmo
implacável dos anos. Rugas, flacidez,
deterioração total por todos os lados, os olhos apagados
e sem brilho. E no olhar opaco nada
que anteveja o futuro. É estranho
este corpo que agora arrasto todos os dias
e cujo passo se torna cada vez mais lento
e sem destino. Não há nada esperando por mim.
Meu corpo, velho companheiro, o sabe,
e compartilha minha desilusão e minhas misérias.
Já não o reconheço. Nada nele é familiar
e antigo. Parece um corpo novo
mas desfeito e desgastado como se fosse
velho. Talvez ele seja mais velho do que eu.
Cheguei irremediavelmente à velhice,
embora por dentro me sinta mais jovem
do que os anos que completei
com uma precisão impressionante e pontual.
E me parece igualmente estranho e desconcertante
ter me tornado mais velho que meu pai,
que morreu aos sessenta e dois. Qual é
realmente o corpo que me abriga?
O deteriorado e velho ou o que jaz dentro dele,
ainda com a curiosidade e o coração despertos?
Em nenhum deles me encontro. Tudo parece estranho.
Alheio já à vida, que arrasto com desgosto
em direção a um outro corpo, que será o meu cadáver
transformado em cinzas e fumaça
espalhada entre as ondas dos mares.

Trad.: Nelson Santander

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Cuerpo Extraño

A Rafael Inglada,
Él sabe por qué.

Como es lógico y natural que ocurra
mi cuerpo ha ido cambiando al paso
implacable de los años. Arrugas, flacidez,
deterioro total por todas partes, los ojos apagados
y sin brillo. Y en la mirada opaca nada
que presienta el futuro. Es extraño
este cuerpo que ahora aûastro cada día
y cuyo paso se hace cada vez más lento
y sin destino. No hay nada que me espere.
Mi cuerpo, antiguo compañero, lo sabe
y comparte mi desazón y mis miserias.
Ya no lo reconozco. Nada en él es familiar
y antiguo. Parece un cuerpo nuevo
pero deshecho y desgastado como si fuera
viejo. Tal vez sea más viejo que yo.
Llegué ya sin remedio hasta la ancianidad,
aunque dentro de mí me sienta más joven
que los años que he cumplido
con una precisión abrumadora y puntual.
Y me parece igualmente raro y desconcertante
haber llegado a ser más viejo que mi padre,
que murió a los sesenta y dos. ¿Cuál es
en realidad el cuerpo que me alberga?
¿El deteriorado y viejo o el que yace dentro de él,
aún con la curiosidad y el corazón despierto?
En ninguno me encuentro. Todo parece extraño.
Ajeno ya aIa vida, que arrastro con desgana
hacia otro cuerpo que será mi cadáver
convertido en ceniza y en humo
esparcido entre las olas de los mares.

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