História
St Andrews: West Sands; Setembro de 2001
Hoje
enquanto empinávamos pipas
– a areia se desfazendo em fitas ao longo da praia
e o cheiro de gasolina de Leuchars1 flutuando sobre
os campos de golfe;
a maré alta distante
cinza-codorna;
pessoas
correndo, ou parando para observar
enquanto os aviões de guerra decolavam e circulavam
na luz matinal –
hoje
– com as notícias em mente e o temor abafado
do que pode vir2 –
ajoelhei-me na areia
com Lucas
recolhendo conchas
e seixos
encontrando evidências de vida em toda essa
deriva:
conchas de caracóis; fragmentos de peixes-navalha;
manchas de membranas e mascarenha nas rochas desgastadas pela maré.
Às vezes penso que o que nos define
não é o parentesco nem nossos atributos naturais
mas algo perdido entre o mundo que possuímos
e o que sonhamos além de nossos nomes
em dias como este
nossas linhas erguidas ao vento
nossos corpos fixos e ancorados à costa
e embora estejamos confinados pelos limites
o que nos prende à gravidade e à luz
tem mais a ver com a distância e as formas
que encontramos na água
lendo no livro
dos sedimentos e das marés:
o rosa ou o azul-petróleo
das águas-vivas e das anêmonas
combinando com a primeira
nudez de uma criança.
Às vezes, fico tonto de medo
de perder tudo – o mar, o céu,
todas as criaturas vivas, florestas, estuários:
negociamos tanto para compreender o virtual
que mal registramos a deriva e o repuxo
de outros corpos
mal apreendemos
o momento enquanto ele acontece: mudanças na luz
e no clima
e as formas locais e discretas
da história: o peixe preso pela maré
além da praia;
a longa vigília
das carpas ornamentais nos parques públicos
cativas e radiantes
suspensas em seu próprio
dourado transitório
que arde lentamente;
compotas de ovas
e carapaus
ou peixes-dourados levados para casa
dos parques de diversão
ao som do rádio;
mas este é o problema: como estar vivo
em todo este admirado e contemplativo mundo
e não causar danos
uma criança na praia
peneirando madeira e grama seca da areia
e intrigada com os padrões de uma concha
seus pais na duna calças folgadas com uma pipa
plugada no céu
nervos e linha:
pacientes; assustados; mas ainda assim, em meio a tudo,
atentos ao irremediável.
N. do T.: 1. “Leuchars” é uma referência a uma vila escocesa localizada perto de St Andrews, West Sands. Essa vila é conhecida por abrigar uma base da Força Aérea Real Britânica (RAF); 2. Referência aos ataques de 11 de setembro de 2001, quando o World Trade Center em Nova York foi alvo de atentados terroristas coordenados por membros da Al-Qaeda, resultando em colapso, perda de vidas e impacto global significativo.
Aqui você pode ler uma ótima análise deste poema.
History
St Andrews: West Sands; September 2001
Today
as we flew the kites
– the sand spinning off in ribbons along the beach
and that gasoline smell from Leuchars gusting across
the golf links;
the tide far out
and quail-grey in the distance;
people
jogging, or stopping to watch
as the war planes cambered and turned
in the morning light –
today
– with the news in my mind, and the muffled dread
of what may come –
I knelt down in the sand
with Lucas
gathering shells
and pebbles
finding evidence of life in all this
driftwork:
snail shells; shreds of razorfish;
smudges of weed and flesh on tideworn stone.
At times I think what makes us who we are
is neither kinship nor our given states
but something lost between the world we own
and what we dream about behind the names
on days like this
our lines raised in the wind
our bodies fixed and anchored to the shore
and though we are confined by property
what tethers us to gravity and light
has most to do with distance and the shapes
we find in water
reading from the book
of silt and tides:
the rose or petrol blue
of jellyfish and sea anemone
combining with a child's
first nakedness.
Sometimes I am dizzy with the fear
of losing everything - the sea, the sky,
all living creatures, forests, estuaries:
we trade so much to know the virtual
we scarcely register the drift and tug
of other bodies
scarcely apprehend
the moment as it happens: shifts of light
and weather
and the quiet, local forms
of history: the fish lodged in the tide
beyond the sands;
the long insomnia
of ornamental carp in public parks
captive and bright
and hung in their own
slow-burning
transitive gold;
jamjars of spawn
and sticklebacks
or goldfish carried home
from fairgrounds
to the hum of radio;
but this is the problem: how to be alive
in all this gazed-upon and cherished world
and do no harm
a toddler on a beach
sifting wood and dried weed from the sand
and puzzled by the pattern on a shell
his parents on the dune slacks with a kite
plugged into the sky
all nerve and line:
patient; afraid; but still, through everything
attentive to the irredeemable.
1 Comentário