Wislawa Szymborska – Engano

Soou o telefone na galeria de arte,
soou à meia-noite na sala quieta;
se houvesse gente dormindo, acordaria na certa,
mas aqui há somente insones profetas,
somente reis empalidecem de luar
e olham indiferentes o que há para olhar,
e a mulher do usurário, agitada na aparência,
fita justo essa coisa sonante na lareira,
mas não, não larga o seu leque,
como os outros aferrada à sua inércia.
Altivamente ausentes, em ricas vestes ou nus,
tratam o alarme noturno com indiferença,
na qual, juro, há mais negro humor
do que se da moldura saltasse o próprio mordomo-mor
(nada além do silêncio, aliás, lhe soa ao ouvido).
E o fato de que alguém na cidade, há longos instantes, se afana
segurando ingenuamente o receptor
tendo discado um número errado? Ele vive, logo se engana.

Trad.: Regina Przybycien

Deixe um comentário