A estrada não era tão perigosa na época,
quando eu caminhava até a mureta de aço,
inclinava meu corpo flexível de menina, e contemplava
a água fria do riacho. Em uma úmida nascente,
a água que corria clara e alta, peixinhos
petiscando areia e lodo, um caranguejo
ensombrado pelos altos juncos das margens.
Eu podia olhar durante horas, algo
sempre novo em cada pedaço aguacento —
uma tampinha de garrafa, uma bota preta de homem, uma rã.
Uma vez, uma carcaça de guaxinim, metade sob
o viaduto, metade fora, apodreceu lentamente
ao longo de meses. Eu o examinava todos os dias,
observando até que os ossos brancos de sua pata
ficassem totalmente sem pele e parecessem estender-se
em direção ao sol à medida em que ele entrava na água,
mostrando todos os seus cinco doces dedos tensos
ainda contraídos. Eu não acho que a venerava,
sua morte, mas eu gostava das evidências
dela, de como parecia com um trabalho diariamente
tomar nota de sua mudança na areia.
Trad.: Nelson Santander
Overpass
The road wasn’t as hazardous then,
when I’d walk to the steel guardrail,
lean my bendy girl body over, and stare
at the cold creek water. In a wet spring,
the water’d run clear and high, minnows
mouthing the sand and silt, a crawdad
shadowed by the shore’s long reeds.
I could stare for hours, something
always new in each watery wedge—
a bottle top, a man’s black boot, a toad.
Once, a raccoon’s carcass half under
the overpass, half out, slowly decayed
over months. I’d check on him each day,
watching until the white bones of his hand
were totally skinless and seemed to reach
out toward the sun as it hit the water,
showing all five of his sweet tensile fingers
still clinging. I don’t think I worshipped
him, his deadness, but I liked the evidence
of him, how it felt like a job to daily
take note of his shifting into the sand.
[…] 31. Ada Limón – Viaduto A estrada não era tão perigosa na época, quando eu caminhava até a mureta de aço, inclinava meu corpo flexível de menina, e contemplava a água fria do riacho. (…) […]
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