Louise Glück – A íris selvagem

No fim do meu sofrimento
havia uma saída.

Ouça-me: do que você chama de morte,
eu me lembro.

Acima, ruídos, ramos de pinheiros se movendo.
Depois, nada. O sol fraco
cintilou sobre a superfície seca.

É terrível sobreviver
como consciência
sepultada sob a terra escura.

E então acabou: aquilo que você mais teme, sendo
uma alma e impossibilitada
de falar, terminando abruptamente, a terra dura
cedendo um pouco. E o que me pareceu serem
pássaros se movendo por entre os arbustos rasteiros.

Você que não se lembra
da passagem do outro mundo
eu lhe digo o que poderia falar vezes sem conta: o que quer que
retorne do esquecimento retorna
para encontrar uma voz:

do centro da minha vida surgiu
uma grande fonte, profundas
sombras azuis na água azul do mar.

Trad.: Nelson Santander

The wild iris

At the end of my suffering
there was a door.

Hear me out: that which you call death
I remember.

Overhead, noises, branches of the pine shifting.
Then nothing. The weak sun
flickered over the dry surface.

It is terrible to survive
as consciousness
buried in the dark earth.

Then it was over: that which you fear, being
a soul and unable
to speak, ending abruptly, the stiff earth
bending a little. And what I took to be
birds darting in low shrubs.

You who do not remember
passage from the other world
I tell you I could speak again: whatever
returns from oblivion returns
to find a voice:

from the center of my life came
a great fountain, deep blue
shadows on azure seawater.

Sobre este poema, a poeta Fleda Brown diz:

“Aqui está o poema do título. Você sabe como é uma íris selvagem?
(…) Essa [flor de] íris está descrevendo como é sair debaixo da terra escura. Está descrevendo o quão terrível é permanecer enterrado durante todo o inverno, estar consciente de estar enterrado, esperando. Então o surgimento da terra, o falar com a única voz que uma flor tem, sua flor. É estranho como Glück nos faz sentir como se fossemos a íris e, na verdade, percebemos que SOMOS, como a íris, a consciência que espera para falar com nossa própria voz.(…)”

E referindo-se aos versos finais do poema:

“Eu acho que ninguém jamais descreveu a flor de íris melhor do que isso: uma grande fonte, sombras azuis profundas na água do mar azul. Não posso olhar para uma íris agora sem ver uma fonte.”

http://fledabrown.com/columnist/michigan-writers-on-the-air/louise-gluck/