Larry Levis – Na cidade das luzes

A última coisa que meu pai fez por mim
Foi traçar um caminho: ele morreu, & assim
Tornou a morte possível. Se ele conseguiu, eu
Também, um dia, terei essa honra. Certa vez,

À noite, caminhei pelas ruas iluminadas
De Nova York, do Gramercy Park Hotel,
Subindo a Lexington & naquela hora, sozinho,
Eu parei de ouvir o tráfego, as vozes, a agitação

Do vento de primavera alçando um jornal alto,
Sobre as luzes. As ruas molhadas,
E brilhantes. Sem sons. Certa vez,

Quando vi meu filho nascer, pensei
Como esse mundo deve soar alto para ele, como algo final.

Naquela noite, por respeito a alguém ausente,
Deixei de escutá-lo.

Por respeito a alguém ausente,
Devo dizer

Que essa não é toda a história.
O fato é que ainda estava apaixonado.
Meu pai tinha morrido, & eu ainda estava apaixonado. Sei
Que é de mau gosto dizer dessa forma. Diga-me,
Como você diria?

A história é: querendo ficar sozinho & desejando
A solidão tranquila dos viajantes,

Me despedi em um aeroporto & voei para o oeste.
Aconteceu de outro modo.
E onde a segurei perto de mim,
Minha pele ficou em carne viva, & esfolada.

Ao descer, olhei para a luz cobrindo os campos
De pálidas videiras, & pequenas cidades, cada uma
Com uma torre de água; depois as sobras das asas;
Depois, nada.

Meu único conselho é não ir embora.
Ou vá. A maioria

De minhas decisões foi errada.

Quando acordo, jogo água fria
Em meu rosto. Fecho meus olhos.

Um corpo deseja ser abraçado, & abraçado, & o que
Você pode fazer sobre isso?

Porque há rostos que talvez nunca mais veja,
Há duas coisas que quero lembrar
Sobre a luz, & o que ela faz conosco:

Seus olhos verdes brilhantes em um aeroporto — como eles se dilataram
Como se incrédulos;
E meu pai abrindo o portão: uma cidade iluminada &

Silente.

Trad.: Nelson Santander

Mais do que uma leitura, uma experiência. Clique, compre e contribua para manter a poesia viva em nosso blog

In the City of Light

The last thing my father did for me
Was map a way: he died, & so
Made death possible. If he could do it, I
Will also, someday, be so honored. Once,

At night, I walked through the lit streets
Of New York, from the Gramercy Park Hotel
Up Lexington & at that hour, alone,
I stopped hearing traffic, voices, the racket

Of spring wind lifting a newspaper high
Above the lights. The streets wet,
And shining. No sounds. Once,

When I saw my son be born, I thought
How loud this world must be to him, how final.

That night, out of respect for someone missing,
I stopped listening to it.

Out of respect for someone missing,
I have to say

This isn’t the whole story.
The fact is, I was still in love.
My father died, & I was still in love. I know
It’s in bad taste to say it quite this way. Tell me,
How would you say it?

The story goes: wanting to be alone & wanting
The easy loneliness of travelers,

I said good-bye in an airport & flew west.
It happened otherwise.
And where I’d held her close to me,
My skin felt raw, & flayed.

Descending, I looked down at light lacquering fields
Of pale vines, & small towns, each
With a water tower; then the shadows of wings;
Then nothing.

My only advice is not to go away.
Or, go away. Most

Of my decisions have been wrong.

When I wake, I lift cold water
To my face. I close my eyes.

A body wishes to be held, & held, & what
Can you do about that?

Because there are faces I might never see again,
There are two things I want to remember
About light, & what it does to us.

Her bright, green eyes at an airport—how they widened
As if in disbelief;
And my father opening the gate: a lit, & silent

City.

Deixe um comentário