Onde está a memória dos dias,
que foram teus na terra e teceram
fortuna e mágoa, e foram para ti o universo?
O rio numerável dos anos
os perdeu: foste uma palavra num índice.
A outros deram glória interminável os deuses,
inscrições e exergos e monumentos e historiadores pontuais;
de ti somente sabemos, obscuro amigo,
que ouviste o rouxinol numa tarde.
Entre os asfódelos da sombra, a tua sombra vã
pensará que os deuses foram avaros.
Porém os dias são uma rede de misérias triviais –
e haverá sorte melhor do que ser a cinza
de que se faz o olvido?
Sobre outros lançaram os deuses
a inexorável luz da glória, que mira as entranhas e enumera as fendas –
da glória, que acaba por fazer murchar a rosa que venera;
contigo foram mais piedosos, irmão.
No êxtase de um entardecer que não será uma noite,
ouves a voz do rouxinol de Teócrito.
Trad.: Renato Suttana